O novo governo Lula e a esquerda socialista: abrir mão de ser “oposição de esquerda” só vai fortalecer a extrema-direita
Um debate com o PSOL e outros apoiadores de Lula
Marcio, dezembro de 2022
Conforme vai se constituindo o novo governo Lula, abre-se um importante debate entre a esquerda socialista: devemos apoiar esse governo, ou construir uma oposição classista a ele? O PSOL, que surgiu de uma cisão do PT justamente para construir uma oposição pela esquerda ao 1º governo Lula, tem estado nos holofotes desse debate. Falaremos mais diretamente dele nesse texto, mas de forma alguma o debate se limita aos grupos internos do PSOL, pois muitos militantes socialistas não organizados compartilham de posições que trataremos aqui. Esperamos, assim, contribuir para que a militância socialista encontre um caminho adequado para enfrentar os patrões e a extrema-direita no próximo período.
PSOL se recusa a ser oposição a Lula
Após certa disputa interna, a Direção Nacional do PSOL decidiu (em 17/12) que o partido irá apoiar o governo Lula. A decisão não foi exatamente o que desejava setores de peso do PSOL, como a Primavera Socialista (do presidente do partido, Juliano Medeiros) e Revolução Solidária (corrente de Guilherme Boulos), pois esse apoio não envolverá uma integração formal ao governo, como eles queriam. Contudo, a decisão foi uma amálgama entre o que defendia esse setor e o campo “PSOL Semente”, integrado por grupos como Resistência, Insurgência, Subverta e outros coletivos menores.
A diferença central nas semanas após a vitória de Lula era se o PSOL deveria apoiar o governo “de dentro”, ocupando cargos, ou “de fora”, compondo sua base parlamentar, mas sem ocupar cargos. A decisão tomada é que membros do partido estão autorizados a ocuparem cargos no governo, inclusive ministérios (como o provável caso de Sônia Guajajara, cotada para o Ministério dos Povos Originários), mas desde que não estejam, ao mesmo tempo, em cargos executivos do partido e não “falem em seu nome” enquanto estiverem no governo federal. A ideia é apoiar o governo, mas manter “independência” em relação a ele. Obviamente, a decisão é mais formal do que prática, pois tenta estabelecer uma diferença sem muito sentido político, entre ser do partido e estar no governo e “falar em nome” do partido. Essa amálgama foi possível, pois há acordo em quase todo o PSOL no que é essencial: apoiar politicamente o governo Lula, rejeitando ser oposição.
Vale destacar que o “grande debate” da vez lembra muito o anterior, que foi sobre apoiar Lula somente no 2º turno das eleições, ou desde o 1º. Ou seja, não é de agora que as divergências centrais que atravessam o PSOL são muito mais sobre elementos secundários de uma política de aproximação com Lula e o PT do que sobre adotar ou não esse rumo, através do qual o partido se constitui cada vez mais como uma “ala esquerda do partido da ordem”: ao invés de propor a superação do capitalismo, busca uma forma “menos pior” de geri-lo, junto a setores da burguesia. Isso pode ser visto também no fato de que apenas setores muito minoritários se opuseram à “semi-fusão” efetuada com a REDE no começo de 2022, um partido burguês financiado por proprietários de empresas como Itaú e à Natura (leia aqui o que escrevemos à época sobre esse tema: https://rr4i.milharal.org/2022/05/03/federacao-com-a-rede-o-ultimo-prego-no-caixao-do-PSOL/).
Vejamos como setores do PSOL justificaram esse apoio a Lula. Pouco antes da decisão da DN ser tomada, Boulos declarou: “Quem vai fazer oposição ao Lula é o bolsonarismo, e não estaremos ao lado deles. O momento do país é outro. Enfrentamos uma oposição raivosa. E não dá para brincar com isso. Eu defendo que o PSOL integre a base de apoio ao Lula. O governo será de frente ampla, e nós temos que disputar internamente espaços para puxar a agenda do país para a esquerda.” (https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2022/12/boulos-rebate-samia-e-diz-que-PSOL-nao-fara-oposicao-a-lula-ao-lado-de-bolsonaristas.shtml).
De forma muito semelhante, Valerio Arcary, principal porta voz da Resistência, afirmou o seguinte durante o debate que ocorreu antes da decisão do dia 17: “A situação ainda reacionária com a presença de uma extrema-direita poderosa, que irá ocupar todo o espaço de oposição, não permite qualquer tergiversação. Turbulências como o vandalismo neofascista nas ruas de Brasília no dia da diplomação de Lula confirmam, mais uma vez, que a tática de oposição de esquerda seria um erro imperdoável. […] A disputa do destino do governo Lula será feita de baixo para cima e de fora para dentro. […] A definição como oposição de esquerda condenaria o PSOL a uma solidão na marginalidade.” (https://esquerdaonline.com.br/2022/12/13/tres-taticas-dividem-a-esquerda-socialista/)
De forma complementar a esse texto de Arcary, a declaração da Resistência sobre a decisão tomada pela DN do PSOL afirma o seguinte: “Por todas essas razões, o PSOL estará ao lado de Lula contra o Bolsonarismo e combaterá a oposição ao seu governo. Nossa relação será baseada no compromisso com as pautas populares, não em negociação de espaços ou condicionada à composição de Ministérios. Enquanto o centrão negocia cargos, o PSOL irá privilegiar a negociação de propostas. Formulamos uma plataforma elaborada por dezenas de grupos programáticos e um brilhante levantamento da FLCMF [Fundação Lauro Campos / Marielle Franco] de quais medidas precisam ser revogadas para deixar no passado o pesadelo bolsonarista. É assim que queremos disputar politicamente a agenda do Governo.” (https://esquerdaonline.com.br/2022/12/17/PSOL-reafirma-seu-compromisso-com-lula-para-combater-a-extrema-direita-mas-nao-tera-cargos-na-gestao-petista/)
São poucos e pouco numerosos os grupos que defendem que o PSOL constitua uma “oposição de esquerda”: Esquerda Marxista, Luta Socialista, Comuna, CST (que está com um pé fora e outro dentro do partido) e alguns coletivos regionais. Para os que se reivindicam revolucionários, defendemos que rompam com o PSOL, para não serem parte de um partido que sustentará a dominação do capital para enganar e reprimir os trabalhadores, sob justificativa de assim “buscar conquistas”. (Para um debate maior sobre isso, veja: https://rr4i.milharal.org/2022/05/03/federacao-com-a-rede-o-ultimo-prego-no-caixao-do-PSOL/). É querer se enganar achar que ainda é possível fazer oposição ao governo Lula de dentro do PSOL, sem que seja um mero “esperneio” esporádico às ações da Direção.
Outros setores importantes, como o MES, de Luciana Genro, ficam em cima do muro, bem no estilo da amálgama da decisão da DN, sobre a qual a corrente declarou tratar-se de uma decisão que “preserva a natureza do PSOL” e que consistiu em uma “vitória da ala esquerda” do partido contra as forças representadas por Medeiros e Boulos, tidas como “adesistas” ao PT. Para o MES, é necessário que o PSOL preserve sua “independência” em relação ao governo e se apresente enquanto “alternativa antissistema pela esquerda”, mas, ao mesmo tempo, declara que, diante do governo Lula, é necessário “apoiar as medidas progressistas e bloquear as tentativas golpistas da extrema direita” (https://movimentorevista.com.br/2022/12/sobre-a-ultima-reuniao-do-diretorio-nacional-do-PSOL/). Algo muito difícil de fazer na prática, em especial dado que os setores majoritários do PSOL, por sua vez, apresentam essa mesma resolução como forma de dar apoio político a Lula.
Assim como Boulos / Revolução Solidária e Arcary / Resistência, a maior parte do PSOL justifica o apoio político ao governo como forma de enfrentar a extrema-direita – o mesmo argumento usado em relação ao apoio eleitoral à chapa de Lula-Alckmin em outubro e também em relação a várias candidaturas burguesas em 2018 e 2020. Ou seja, dada a presença da extrema-direita no cenário político, assume-se que não há espaço para uma oposição pela esquerda ao governo, e conclui-se daí que o melhor a se fazer é “disputar” tal governo, ainda que “por fora”, pressionando-o a adotar medidas consideradas progressistas. Na prática, isso significa atuar como uma “ala esquerda” do governo, ainda que uma “ala externa” – ou parcialmente externa, dados os malabarismos feitos para permitir que membros do partido estejam até no 1º escalão do governo, encabeçando ministérios.
Apoiar o governo é a melhor forma de combater a extrema-direita?
Diante dessa justificativa central para o apoio a Lula, cabe questionarmos: apoiar o governo é a melhor forma de combater a extrema direita? Como já debatemos em outros materiais, não consideramos todo o bolsonarismo como um movimento fascista (https://rr4i.milharal.org/2018/06/26/a-luta-antifascista-e-as-tarefas-dos-comunistas/). Não obstante, temos afirmado desde 2018 que essa caracterização é secundária para a delineação das tarefas políticas centrais do momento, pois o bolsonarismo sendo ou não fascismo como um todo, a tarefa central dos socialistas deve ser a de erguer uma frente de lutas da classe trabalhadora (“frente única”), tanto para combater a extrema-direita nas ruas e quanto lutar por melhores condições de vida diante dos patrões e governos.
Sendo o bolsonarismo como um todo um movimento fascista, o que se altera nessa política é a hierarquia máxima que precisa ser dada ao combate direto a essa extrema-direita e a construção de políticas de autodefesa dos movimentos sociais nos locais de trabalho, estudo e moradia onde atuam. Essas medidas, contudo, se fazem necessárias de qualquer forma se o bolsonarismo como um todo não for fascismo, uma vez que parte dele inegavelmente o é, e que grupelhos fascistas tem crescido nas sombras deste e ganhado apoio institucional em vários aspectos (como a blindagem da PRF e do Exército a atos de terror cometidos recentemente), tornando-se cada vez mais audazes. A diferença fica na ênfase, pois acreditamos que não estamos lidando, no momento, com um movimento fascista de massas atacando sistematicamente os sindicatos e demais movimentos sociais, e sim com setores fascistas ainda minoritários no interior de uma extrema-direita pautada pela demagogia reacionária e militarista. De qualquer forma, esmagar esses embriões de um movimento fascista é fundamental.
A questão central é que, para revolucionários, de forma alguma o combate ao fascismo passa pela política de “frente ampla” com a burguesia. Isso foi tentado nos anos 1930 pelos Partidos Comunistas subordinados à burocracia soviética stalinista, na forma das “Frentes Populares”, e não conseguiu impedir o fascismo de chegar ao poder em lugares como Espanha e França – pelo contrário, em casos como o espanhol, ajudou nessa chegada ao poder, ao sabotar de forma sangrenta a revolução proletária e camponesa que estava em curso e que poderia ter esmagado o franquismo, para manter a aliança com os “aliados” liberais. Conforme defendeu à época a nascente Quarta Internacional “trotskista”, apenas a Frente Única Antifascista, organização de frente única para a luta construída a partir dos sindicatos e movimentos sociais, é que poderia derrotar o fascismo, aniquilando-o através da mobilização da classe trabalhadora em unidade de ação de suas diversas organizações políticas.
Por sua vez, a burguesia, mesmo os setores que alguns acreditavam ser “progressistas”, ou foram coniventes com o ascenso fascista, ou o ajudaram ativamente por temerem muito mais o proletariado. Basta lembrarmos que o conjunto da burguesia brasileira cerrou fileiras com o reacionário Bolsonaro ao longo desses quatro anos, mesmo no auge do desgoverno durante a pandemia (e ainda que fazendo críticas aqui e ali), pois ele e Paulo Guedes seguiram defendendo a política de “austeridade” demanda pelo grande capital – retida de direitos da classe trabalhadora, arrocho salarial e redução dos gastos públicos com medidas sociais. Portanto, não é com apoio ao governo que vamos derrotar a extrema-direita, em especial seus elementos mais perigosos, os fascistas, pois o governo de “frente ampla” de Lula será totalmente leniente com tais forças e irá “confiar nas instituições” que em geral as protegem..
Obviamente, ameaças golpistas e terroristas da extrema-direita contra o governo Lula devem ser combatidas, pois, se vitoriosas, elas inevitavelmente terão consequências negativas para a classe trabalhadora, como cerceamento do direito de expressão, de organização e de voto, além de uma intensificação da exploração. Esse combate, contudo, não se faz com apoio político ao governo. Se faz com os próprios métodos de luta da classe trabalhadora: greves e mobilizações de massas. Uma coisa é a necessária unidade de ação com apoiadores e mesmo membros do governo para concretizar essas ações para repelir e esmagar a extrema-direita, quando for o caso. Outra muito diferente (e nada eficaz) é apoiar politicamente o governo ou tentar “disputa-lo”, “empurrá-lo” para esquerda etc.
As expectativas dos trabalhadores com Lula não vão se realizar: deixaremos a extrema-direita instrumentalizar a inevitável decepção?
Na verdade, na essência da posição de não fazer oposição ao governo Lula e, ao invés, “disputá-lo” (seja “por fora” ou “por dentro”) reside uma posição mais profunda do que uma leitura sobre o caráter do bolsonarismo e as tarefas daí derivadas. Essa posição está assentada sobre o reformismo, que nega a análise marxista do Estado enquanto um instrumento de dominação de classes. Junto ao reformismo, vem sempre sua irmã gêmea, que é a negação de que a revolução socialista é não só uma necessidade como também uma possibilidade concreta no momento histórico em que vivemos. Momento esse que, tal qual o início da era imperialista do capitalismo, segue sendo marcado, em seus traços fundamentais, pelas constantes crises econômicas, instabilidades políticas dos regimes burgueses, guerras internacionais e situações potencialmente revolucionárias (em que as massas perdem a confiança nas instituições burguesas e se mobilizam fortemente por mudanças profundas). Assim, negando que a revolução seja uma tarefa para nosso tempo de vida, relegando-a a um futuro distante e incerto, resta lutar por uma vida “menos pior” sob o capitalismo, e busca-se fazer isso iludindo-se sobre a possibilidade de “disputar” governos do Estado burguês. Essa posição, inclusive, já foi tentada por anos por setores da esquerda brasileira após a redemocratização, sob o nome de “estratégia democrática e popular”: elege-se um governo “progressista” e busca-se empurrá-lo mais à esquerda através da ação dos movimentos sociais e parlamentares de esquerda. Setores que acabaram por fundar o PSOL passaram anos dentro do PT defendendo isso, sem resultados. Outros permaneceram no PT defendendo essa lógica durante os governos anteriores, também sem resultados duradouros. Não será diferente agora.
Acontece que não é possível um capitalismo “menos pior” para quem vive de seu próprio trabalho, a não ser de forma temporária, como fruto de mobilizações tão grandes que fazem a burguesia preferir ceder parte de seus lucros para acalmar o proletariado a perder sua propriedade. Mobilizações essas que envolvem fortes greves gerais e rebeliões populares, não a vaga “pressão” sobre um dado governo. E, mesmo que se conquiste essas concessões, elas têm data de validade: tão logo as mobilizações esfriem e a burguesia consiga reconstruir sua hegemonia (ou seja, sua estabilidade política, no sentido de confiança no regime), começa o desmonte das concessões, para reverter novamente os investimentos para os bolsos dos patrões.
Foi exatamente isso o que vimos na história recente de nosso país, com as fortes greves dos anos 1980 tendo conquistando o sufrágio realmente amplo para o voto, o SUS enquanto sistema universal de saúde pública, a universalização do ensino básico de forma pública, direitos trabalhistas, aumentos salariais, diversos programas sociais etc., e, em anos mais recentes, o desmonte disso tudo como forma de a burguesia retomar os patamares de lucro afetados pela crise econômica mundial de 2008. Em escala mais profunda, foi também o que ocorreu na Europa ocidental, onde o medo da revolução socialista e da expansão soviética nos anos após a Segunda Guerra Mundial levou a burguesia a fazer concessões ainda mais significativas, mas que passaram a ser desmontadas a partir dos anos 1970-80 sob a defesa do neoliberalismo, o que se acelerou e aprofundou bastante após a contrarrevolução capitalista na URSS e seus países satélites no final do século e as crises econômicas que se seguiram.
Apoiar o governo, na verdade, irá pavimentar um caminho muito perigoso, que é o de deixar para a extrema-direita, incluindo os fascistas, a captação da decepção que inevitavelmente ocorrerá entre os trabalhadores com o não cumprimento das promessas de uma vida significativamente melhor que Lula (e seus apoiadores) fizeram durante a campanha eleitoral. Temos que ter clareza da estrutura social do nosso país e também da conjuntura econômica mundial.
A burguesia a nível mundial ainda não conseguiu reverter os efeitos da crise econômica de 2008. No mundo inteiro, as taxas de lucro seguem abaixo do que os grandes capitalistas necessitam para manterem seus negócios. A principal forma com que eles têm atuado para reverter essa situação é reduzir os gastos com salários e outros custos com os trabalhadores que empregam, bem como se apropriar de uma fatia maior do fundo público (o conjunto de impostos recolhidos pelos Estados). Em outras palavras, “austeridade”, que tem sido o grito de guerra dos capitalistas nos últimos anos em tudo que é canto do planeta. De forma secundária, as guerras também têm servido para aqueles Estados com mais recursos à sua disposição auxiliarem suas burguesias, redesenhando a divisão do mercado mundial (daí o envolvimento de potências imperialistas em países como Iraque, Líbia, Iêmen e Síria, por exemplo, além das crescentes tensões contra Rússia e a China).
Ademais, quando falamos da burguesia brasileira, temos que ter clareza que se trata de uma classe proprietária espremida entre, de um lado, um numeroso proletariado de um país extremamente desigual, com significativos índices de pobreza e miséria, e, de outro lado, as burguesias das potências imperialistas, que cobram seu quinhão nos investimentos feitos em conjunto com a brasileira e que também disputam com ela os recursos do nosso país (matérias-primas, força de trabalho, mercado consumidor).
Ou seja, não há espaço, tanto do ponto de vista da estrutura social de um país da periferia do sistema capitalista, quanto do ponto de vista da atual conjuntura econômica mundial, para que haja melhorias significativas das condições de vida da classe trabalhadora brasileira sem uma ruptura com o capitalismo. Não há espaço nem sequer para as políticas de redistribuição de renda e inclusão social praticadas nos governos anteriores do PT, as quais já eram bastante insuficientes diante da profunda desigualdade social de nosso país e, mesmo assim, começaram a ser desmontadas ainda durante o 2º governo Dilma, que se curvou aos clamores da burguesia por “austeridade” (e mesmo assim foi apeada do poder por não implementar essa austeridade no ritmo e profundidade desejada pelos patrões).
Muitos votaram em Lula simplesmente porque ele não era Bolsonaro. Mas a maioria tem algum grau de ilusão de que Lula será capaz de trazer melhorias às condições de vida da população. Ilusão essa que é reforçada por aqueles socialistas que abrem mão de uma perspectiva revolucionária e optam por “disputar” a máquina de dominação da burguesia que é o Estado. Quando essas ilusões forem quebradas, a quem essa massa de trabalhadores vai recorrer? Obviamente, os que ajudaram a disseminar tais ilusões serão rejeitados junto com o governo. Portanto, para os socialistas, apoiar o governo Lula é cavar a própria cova. Pior ainda, é desarmar a classe trabalhadora para enfrentar os desafios que virão e jogar água no moinho da extrema-direita, que, através de muita demagogia, tentará instrumentalizar essa inevitável decepção de setores do proletariado. Foi o que vimos em certa medida em 2018, quando muitos apoiaram Bolsonaro por se iludirem que ele era “contra tudo que está aí”, sem que houvesse uma alternativa anticapitalista significativa para disputar com esse demagogo reacionário.
O caminho para a oposição de esquerda ao novo governo
Por isso tudo, não podemos dar nenhum apoio político ao governo Lula. Esse será um governo a serviço do grande capital, por mais que se paute por uma orientação de redução das desigualdades sociais (ou seja, um governo liberal-social) e realize algumas reformas. Como tal, ele irá decepcionar seus apoiadores entre a classe trabalhadora e, pior ainda, irá desferir muitos ataques contra tal classe para salvaguardar os lucros de seus senhores. A tarefa dos socialistas diante desse governo é construir instrumentos de unidade de ação (“frente única”) para lutar por melhores condições de vida contra os patrões e os governantes a seu serviço (sejam os de direita ou os que se dizem falsamente de esquerda), bem como para enfrentar a extrema-direita e se proteger dela. Ser socialista é defender a superação dessa sociedade de miséria e sofrimento que é o capitalismo. Não se pode fazer isso apoiando um governo burguês. Fazendo isso, só adiamos a vitória da necessária revolução socialista e prolongamos o nosso próprio sofrimento.
O único caminho possível é atuarmos para convencer o povo da necessidade e da viabilidade da revolução socialista, enquanto construímos instrumentos frentes de luta, independentes de governos e patrões, em torno de demandas cuja necessidade é sentida por todo trabalhador, tais como: auxílio emergencial de um salário mínimo a todos que precisam, financiado pelo confisco dos grandes lucros; reajuste emergencial dos salários conforme a inflação; redução da jornada de trabalho sem redução de salário para garantir emprego a todos; estatização das grandes empresas e dos grandes bancos, sob controle dos trabalhadores; reestatização da Petrobrás e fim da política internacional de preços dos combustíveis; controle social sobre a produção e exportação de alimentos para combater a fome. É na luta por esse tipo de demandas que nossa classe perceberá, na prática, a necessidade do socialismo e ganharemos as experiências necessárias para conquistar o poder. Não há alternativa: ou socialismo ou barbárie capitalista!