O Programa de Ensino Integral de Doria e o recuo da APEOESP – Relato de Santo André
Por Rafael Magrão, setembro de 2019.
O governo Doria está efetivando o Programa de Ensino Integral (PEI) em diversas escolas do estado. O PEI irá manter os alunos nas escolas das 7 às 17 horas, mas sem alterar as péssimas condições atuais do sistema de ensino. Ou seja, o programa se resume a fazer das escolas um “depósito” de crianças e adolescentes, que ficarão entregues aos cuidados do Estado praticamente o dia todo, sem que os educadores tenham condições adequadas de atendê-los. O governo pretende implementar esse programa em pelo menos 50% das escolas de SP nós próximos 4 anos.
Além da falta de infraestrutura para lidar com a mudança, as escolas que aderiram encerraram o período noturno devido a número insuficiente de funcionários e diretores presentes na escola. Muitos estudantes serão obrigados a mudar de escola ou mesmo largar os estudos, pois serem remanejados para escolas mais distantes dificulta a sua permanência. Isso afeta especialmente aos estudantes do Ensino de Jovens e Adultos (EJA), que estudam no período noturno e são estudantes trabalhadores, com uma rotina difícil e com origem mais pobre. Para piorar, as escolas que adotarem o PEI irão reduzir drasticamente o numero de professores, já que o programa exige dedicação exclusiva e que os professores sejam efetivos.
No estado de SP, os professores são separados em diversas categorias e os mais precarizados são os categorias O, V e F: nenhuma dessas categorias é concursada, não possuem estabilidade e nem sequer os mesmos direitos e benefícios dos professores efetivos. Desde 2015, o governo do PSDB vem fechando salas de aulas e, a cada ano, mais professores não conseguem atribuir aula (assumir horário) e, quando conseguem, é em mais de duas ou três escolas ao mesmo tempo, ganhando salários que não chegam a dois mil reais. Se o PEI for implementado, um número absurdo de professores ficarão desempregados, e os efetivos serão muito mais explorados.
O governo está diretamente mentindo para a comunidade escolar, e os diretores de escolas estão manobrando as reuniões de conselhos para que esta proposta seja aceita, propagandeando uma falsa injeção de recursos no setor da educação pública. Essa ideia de mais verbas é totalmente mentirosa, já que sabemos que os cortes na educação estão sendo brutais, ou seja, se as escolas atuais regulares já estão precarizadas, imagina o que pode acontecer quando o PEI for implementado em quase 50% da rede, já que em tese o ensino integral é bem mais custoso do que o regular.
O sindicato dos professores de SP, APEOESP, é dirigido pelo PT há décadas. A figura principal do sindicato é a Maria Izabel “Bebel” Noronha, uma burocrata que não entra em uma sala de aula há pelo menos 20 anos e que hoje é deputada estadual na ALESP. A linha atual da APEOESP em relação ao PEI é tentar barrar o projeto na Justiça, com o argumento de que é necessário aguardar as bases tomarem a iniciativa de se mobilizarem para que o sindicato faça algo para além do plano jurídico.
As direções municipais da APEOESP muitas vezes atuam como oposição à direção central do PT. Nas eleições se vota em conselheiros municipais para as subsedes e em chapas fechadas para a direção estadual. Em Santo André, várias escolas já aderiram ao PEI. A direção municipal da APEOESP na cidade é dirigida há algum tempo por um grupo sindical formado por autonomistas e alguns outros militantes, que se chama RPL (Renovar pela Luta), que se reivindica oposição à direção central petista.
Em meados de setembro ocorreu uma reunião da APEOESP Santo André que iria pautar o PEI. Nós do Reagrupamento Revolucionário propusemos que a subsede do sindicato deveria denunciar publicamente em seus materiais a burocracia petista da direção central, já que para vários professores de base o sindicato é uma só coisa e os trabalhadores não veem diferença entre a política da direção da APEOESP e a da subsede. Também defendemos que, além de denunciar o peleguismo da direção central, a subsede deveria convocar assembleias por escola, para que todos os professores tomassem conhecimento dos ataques e conseguissem participar e tomar decisões conjuntas levando essas propostas para a assembleia estadual, e exigir uma assembleia estadual da direção central antes do prazo de aprovação do PEI pelas escolas.
Mas os demais presentes na reunião foram contra denunciar a direção usando os materiais do sindicato, alegando que não podem criticar a direção central, pois em um dos congressos da CUT, teria sido aprovada uma proibição de críticas aos sindicatos filiados feitas em materiais do próprio sindicato. Os dirigentes da subsede Santo André também expressaram temor de represálias da direção central, como corte no repasse sindical e também gangsterismo por parte dos bate-paus da CUT. Esses de fato são riscos reais, mas de que adianta “proteger” o aparato da subsede (por exemplo, assegurando os repasses) se, quando a categoria precisa do sindicato, ele não pode fazer nada?
Também houve postura contrária a realizar assembleias por escolas, com o argumento de que a subsede não tem braços suficientes para efetivar esta política. Também foi alegado que não seria legítimo “provocar” uma situação nas escolas para “forçar” os professores a discutir sobre o assunto. Se a base não está informada e mobilizada sobre o PEI, não é tarefa do sindicato mudar a situação? Não é justamente para esse tipo de coisa – defender os interesses dos trabalhadores – que o sindicato existe? Mesmo não falando claramente, a direção da subsede Santo André na prática conta com um espontaneísmo da categoria contra o PEI.
Posteriormente, ao longo do mês de setembro, a subsede realizou algumas atividades de denúncia do PEI, rodando algumas escolas. Mas o clima de apatia não pode continuar orientando as decisões das reuniões sindicais. De que adianta um sindicato se ele não toma a iniciativa de mobilizar os trabalhadores? É fundamental que os professores mais combativos se façam presentes nas reuniões do sindicato para tentarmos colocar seu aparato a serviço da mobilização, além de levarmos esse debate para as escolas onde estamos. Apenas com uma forte mobilização é que iremos deter esse projeto de precarização do governo Doria, que vai piorar ainda mais a qualidade da educação dos filhos dos trabalhadores!