O que esperar do governo Bolsonaro e como organizar a resistência aos ataques à classe trabalhadora, mulheres, negros e LGBTs?

Por Rafael Ferreira e Marcio Torres, dezembro de 2018-janeiro de 2019.

As eleições foram uma vitória para os grandes empresários, banqueiros, latifundiários e grandes empresas estrangeiras. Sua agenda já vinha sendo aplicada por Temer, como a Reforma Trabalhista e do Ensino, mas esse governo já estava exausto e odiado, sobrevivendo só graças ao imobilismo das burocracias sindicais e da oposição “comportada” do PT e PSOL. Com Bolsonaro e o novo Congresso, apesar dos discursos demagógicos de “mudança” e “renovação”, os grandes capitalistas terão um governo ainda mais comprometido com os ataques aos direitos e condições de vida dos trabalhadores, em prol do aumento dos lucros, mas com certo apoio popular. Isso de forma alguma quer dizer que uma vitória eleitoral de Haddad seria contrária aos interesses das classes dominantes, pois seu programa era ainda mais recuado do que o que vigorou sob Lula e Dilma, prevendo um alinhamento com pontos chaves da agenda neoliberal e com as demandas patronais por “austeridade” (para o povo trabalhador, é claro) [1].

Um governo neoliberal e reacionário, sustentado por demagogia e blindagem judiciária-militar

Com um discurso ultraliberal na economia e baseando-se nos mais atrasados preconceitos (com particular apoio das Igrejas evangélicas), Bolsonaro e seu “superministro da economia” Paulo Guedes pretendem aprovar um ataque ainda mais duro à Previdência Pública, praticamente acabando com ela, além de cortar programas sociais que  hoje são direitos básicos, vender o máximo de empresas estatais que conseguir, afrouxar ainda mais as leis trabalhistas, aumentar a entrega de recursos naturais para empresas estrangeiras (principalmente dos Estados Unidos) e prosseguir o desmonte da educação e saúde públicas que Temer vinha fazendo.

A hipocrisia do discurso de “corte de gastos”, vigente desde o segundo governo Dilma (marcado pelo discurso de “austeridade” e com o “Chicago Boy” Joaquim Levy na Fazenda, que agora retorna para controlar o BNDES), fica clara diante da ampliação dos gastos estatais com os setores-chave do Estado capitalista (como os aumentos salariais exorbitantes para parlamentares e judiciário) e a exclusão dos militares e policiais dos ataques à Previdência. E mais claro ainda diante das bilionárias isenções fiscais e perdão de dívidas para setores do grande empresariado. Medidas que certamente serão mantidas pelo novo Congresso, que conseguiu ser ainda mais atrelado aos interesses das elites do que o anterior e que tem ainda mais parlamentares reacionários, eleitos na esteira da popularidade de Bolsonaro. As bancadas da bala, boi e bíblia (grupo de deputados financiados e representantes dos interesses da indústria armamentista, do agronegócio e de organizações religiosas, respectivamente) se fortaleceram e o PSL de Bolsonaro pulou de “nanico” à segunda maior bancada (atrás do PT), com chances fortes de se tornar a primeira em breve (devido à migração de parlamentares que estão em partidos que não ultrapassaram a cláusula de barreira estabelecida pela reforma política de Cunha e sua gangue).

De início, parte desses parlamentares reacionários irá compor o governo Bolsonaro em peso, em uma distribuição de cargos que não agradou a certos setores empresariais. É o caso em especial o Ministério da Educação, cujo nome indicado pelos tubarões do ensino privado foi “vetado” pela bancada da Bíblia, por não ser “reacionário o suficiente” [2]. Mas também vale mencionar a nomeação de um completo lunático para o Ministério das Relações Exteriores, o qual, assim como o próprio Bolsonaro, tem comprado brigas com países que são grandes compradores de produtos brasileiros (por exemplo na questão da transferência da embaixada brasileira de Israel para Jerusalém, medida que irá gerar ira dos países árabes, para os quais o Brasil é o principal exportador de carne halal) [3].

Ademais, há um claro imbróglio entre o novo governo e os grandes grupos empresariais por detrás dos jornais O Globo, Folha de São Paulo e Estadão. Desde as eleições, tais jornais tiveram atritos sérios com Bolsonaro por estarem apostando em Alckmin (PSDB), e pelo fato do então candidato preferir as redes sociais à imprensa “tradicional”. Em dado momento, Bolsonaro ameaçou diretamente a Folha de corte de verbas publicitárias governamentais. Vale lembrar também que o Grupo Globo tem sólida inserção na área da educação, integrando o grupo empresarial que foi preterido na escolha do Ministro da Educação. Levando isso em conta, não é difícil entender porque, antes mesmo do governo assumir, os três maiores jornais do país têm bombardeado a família Bolsonaro com o escândalo envolvendo Flávio Bolsonaro, seus assessores na ALERJ e seu motorista, em um caso claro de desvio de dinheiro e enriquecimento ilícito. Parece ser um “recado” à família de que tais grupos midiático-empresariais tem grande poder e que devem ser “levados em conta” na hora da divisão do botim, mas pode também ter o efeito não desejado de criar um razoável desgaste entre os eleitores de Bolsonaro logo no início da gestão, atrapalhando a aprovação das medidas desejadas pelo grande capital.

Há também atritos no que tange o alinhamento servil do governo aos EUA e sua política externa (daí os acenos a Israel), o que envolve por exemplo deixar de lado o protagonismo brasileiro no Mercosul (algo temeroso para certos setores burgueses cuja riqueza está vinculada às relações com os países vizinhos) e até mesmo a possibilidade de uma aventura militar contra a Venezuela [*].

Não obstante, logo de início, já está anunciado que três grandes banqueiros controlarão diretamente o Ministério da Fazenda, o BNDES e o Banco Central – respectivamente, Guedes/BTG Pactual, Joaquim Levy/Bradesco e Ilan Goldfajn/Itaú – além de um quadro da bancada ruralista para o Ministério da Agricultura (Tereza Cristina, indicação da Frente Parlamentar da Agropecuária). E, conforme já foi dito, Bolsonaro está inteiramente disposto a encaminhar os ataques demandados pelo grande capital à Previdência Pública, aos direitos trabalhistas restantes e à saúde e educação públicas.

Também comporão em peso o governo altos oficiais da forças armadas, garantindo um “braço forte” para Bolsonaro e sua trupe de parasitas corruptos no caso provável de explosões de revolta social contra as medidas de seu governo que aumentarão a pauperização da população. E há ainda a total sintonia entre o Grupo Record, ligado a Edir Macedo e à Igreja Universal, e o novo governo, tendo os jornais do grupo blindado Bolsonaro do escândalo do Whatsapp durante as eleições.

Nesse cenário, em que o Legislativo e o Executivo estão na mão de reacionários e capachos dos grandes patrões, é uma ilusão esperar qualquer medida institucional significativa para frear os ataques aos direitos da classe trabalhadora e a piora das suas condições de vida, bem como os ataques aos direitos das mulheres, negros e LGBTs. Ademais, há que se levar em conta o papel cada vez mais autônomo e autoritário do Judiciário, em prol da defesa de uma agenda neoliberal bastante sintonizada com as demandas atuais do grande capital nativo e imperialista, por privatizações e retiradas de direitos. O atual presidente do STF, Dias Tofolli, inclusive deixou isso claro em um “manifesto” publicado no El País, em que estabeleceu o ataque à previdência e a “manutenção da ordem” como prioridades do próximo período [4].

Não se trata apenas de palavras, já há vários casos em que o judiciário foi “à ajuda” dos interesses do grande capital, inclusive passando por cima das demais instituições, como recentemente ao autorizar a privatização da CEDAE (Rio de Janeiro), decisão tomada pelo TJ-RJ, após a Assembleia Legislativa ter votado contra tal medida (incluída pelo Executivo fluminense no pacote de “renegociação” da dívida com a União) [5]. Há também casos em que houve “sintonia” entre as diferentes esferas do Estado em relação à pauta dos grandes capitalistas, como quando o Congresso aprovou a terceirização irrestrita e o STF derrubou uma decisão anterior do próprio órgão que poderia vir a atrapalhar a implementação do novo ataque aos trabalhadores [6].

Vale lembrar ainda todo o papel de “árbitro” desempenhado pelo STF durante o impeachment de Dilma e a perseguição jurídica a quadros do PT, como Lula, assegurando que a perseguição se consumasse enquanto blindava aqueles que, a um só tempo, desempenharam o papel de algozes do PT e fiéis implementadores da agenda neoliberal, como Cunha e depois Temer. Blindagem e seletividade que foram realizadas com maior afinco ainda pelos responsáveis da Lava Jato, com Sérgio Moro à frente, e que, ao menos por ora, está mantida em relação a Bolsonaro e sua fraude eleitoral, bem como aos bandidos de quem se cercou, como o futuro Ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que confessou o crime de caixa dois em vídeo, mas foi “perdoado” pelo “superministro da Justiça” de Bolsonaro, o próprio Moro [7].

Não bastasse isso tudo, a chegada de Bolsonaro ao poder reforça os setores da extrema-direita, incluindo aí grupelhos fascistas, que durante as eleições já realizaram ataques violentos a negros, LGBTs e opositores em geral. Há uma forte descrença nas instituições diante da piora das condições de vida, e Bolsonaro soube habilmente se aproveitar disso para se apresentar demagogicamente como a solução “contra tudo isso aí”. Em paralelo, a extrema-direita também se aproveita da situação para apresentar como solução o fim dos supostos “privilégios” dos trabalhadores sindicalizados, funcionários públicos, medidas redistributivas de renda e de inclusão social para negros, mulheres e LGBTs, tratando esses setores como bodes expiatórios para a atual situação, escondendo que os verdadeiros culpados são os grandes capitalistas e sua ganância assassina.

Em boa parte, esses setores estão tendo sucesso porque a esquerda não foi capaz de se apresentar como antissistema, tendo, ao invés disso, legitimado a cada vez mais podre “democracia” capitalista e suas instituições convalescentes. Ao invés de denunciar as relações capitalistas como responsáveis pela crescente miséria, desigualdade social e violência urbana, Boulos e a maioria esmagadora dos candidatos do PSOL concorreram nessas eleições fraudadas prometendo “humanizar” o capitalismo brasileiro e “democratizar” o Estado burguês, enquanto o PT e o PCdoB seguiram defendendo um utópico retorno à pregressa aliança com o grande capital acompanhada de alguma redistribuição de renda e inclusão social.

Diferente da histeria que tomou conta da esquerda ao longo das eleições, apesar de todo o seu reacionarismo, Bolsonaro não pode ser considerado um fascista. Fascismo significa um movimento de massas com braços paramilitares para aniquilar as organizações da classe trabalhadora e instaurar um comando direto do grande capital, por cima das instituições da democracia burguesa. Tudo indica que viveremos um fechamento parcial do regime para viabilizar os ataques aos direitos e condições de vida dos trabalhadores (mais repressão, mais autonomia do judiciário, mais fraudes eleitorais), mas por hora Bolsonaro joga o jogo da falsa “democracia” burguesa, negociando com o Congresso, o Judiciário e as Forças Armadas, tentando atender aos diferentes interesses de cada um para, ao mesmo tempo, seguir enriquecendo às custas do fundo público e aplicar aquilo que demanda o grande capital que o permitiu chegar à Presidência.

Obviamente não está descartado um fortalecimento dos grupelhos fascistas no próximo período, conforme a condição econômica do povo trabalhador e da pequena-burguesia siga piorando, ocorra uma quebra de expectativa de parte razoável da base eleitoral de Bolsonaro com suas medidas neoliberais e escândalos de corrupção, e a esquerda siga sendo incapaz de se apresentar como alternativa antissistema. Nesse cenário, tais setores podem inclusive contar com ajuda e legitimação de Bolsonaro e sua família de corruptos reacionários, caso precisem recorrer a forças para além da polícia e do exército para reprimir possíveis explosões de revolta social.

Tudo isso vai depender da correlação de forças entre os trabalhadores e os capitalistas, por um lado, e da postura das organizações de esquerda de outro. Apenas a organização e luta poderão alterar o futuro sombrio que se avizinha. Sabendo disso, o novo governo já trabalha com a possibilidade de um aprofundamento da lei “antiterrorismo” de Dilma, para criminalizar os movimentos sociais e as mobilizações de resistência. Mas para que haja resistência, é preciso que os trabalhadores tomem consciência de sua condição e do que está por vir. Ao contrário de Haddad (PT), Boulos (PSOL) e de burocratas sindicais como o presidente da CUT, nós não consideramos Bolsonaro um governo “legitimamente eleito” (como eles afirmaram [8]). As eleições envolveram enormes fraudes: prisão de Lula para ficar de fora da disputa, universidades e sindicatos invadidos pela justiça eleitoral e materiais de campanha apreendidos, 12 milhões em financiamento ilegal para campanha via Whatsapp. Mesmo os que votaram no novo governo (menos de 40% do eleitorado, vale lembrar) foram, em sua maioria, enganados por um estelionato eleitoral e por campanhas de mentiras.

O que nos espera sob Bolsonaro é a combinação de aprofundamento dos ataques aos direitos dos trabalhadores com encaminhamento das pautas reacionárias contra mulheres, negros e LGBTs, apoiado em farto uso de repressão sob a benção do alto escalão das forças armadas, e tudo sob uma muito provável blindagem do Judiciário a todos seus crimes e irregularidades enquanto ele estiver encaminhando as medidas demandas pelo grande capital nativo e imperialista.  Caminhamos, portanto, para uma degradação ainda maior da democracia burguesa e das condições de vida do povo trabalhador e das “minorias” (que em nosso país são na verdade a grande maioria da população, no caso das mulheres e negros), gerando terreno fértil para a extrema-direita e grupelhos fascistas – mas também para as organizações socialistas, caso atuem de forma coerente.

Como resistir a tudo isso e onde fica a esquerda socialista nesse cenário?

O futuro que se projeta no horizonte é sem dúvidas sombrio, mas eventos recentes mostram que há motivos para se ter esperança. A classe trabalhadora mostrou sua força e capacidade de resistência com a greve nacional de 28 de abril de 2017, a maior do país desde os anos 1980. Mas as centrais sindicais e os partidos políticos da oposição optaram por adiar a convocação de uma nova rodada grevista e, no caso do PT e PCdoB, inclusive a sabotaram quando veio a ocorrer [9]. O heterogêneo movimento dos caminhoneiros também fez o governo Temer tremer na base. Mas foi mais uma vez boicotado pelo PT e seus satélites, e recebido com um misto de passividade (PSOL, PSTU) ou mesmo hostilidade pela esquerda socialista (MRTEsquerda Diário) [10]. As manifestações “Ele Não”, apesar de hegemonizadas pelo eleitoralismo do PT e PSOL, também mostraram mais uma vez a força das mulheres progressistas e a existência de uma massiva “reserva” progressista na sociedade brasileira, ao aguardo de ser convocada à mobilização (o mesmo vale dizer das massivas manifestações em repúdio ao assassinato da vereadora do PSOL carioca, Marielle Franco, em maio).

Há solo fértil para resistência, a questão é como proceder para ergue-la de fato. O PT e o setor majoritário do PSOL já deixaram claro, através do seu programa de conciliação de classes e melhorias parciais do capitalismo, bem como através das mencionadas declarações de seus ex-candidatos à presidência, que pretendem ser uma “oposição comportada”: farão oposição por dentro das instituições corrompidas da cada vez mais combalida e falsa “democracia” dos ricos, e focarão em derrotar Bolsonaro “daqui a quatro anos”, em novas eleições (quando os direitos sociais já estiverem em pedaços, e a classe dominante ainda mais fortalecida). Haddad inclusive desejou “sucesso” àquele que vai arrancar nossos direitos, em consonância com a passividade e omissão que as centrais sindicais e movimentos dirigidos e influenciados pelo PT têm demonstrado (sequer se mobilizaram para impedir o fim do imposto sindical, base do seu parasitismo, imaginem se o farão para defender os trabalhadores precarizados!).

Existem hoje três tarefas fundamentais colocadas para a classe trabalhadora: a luta contra os ataques aos seus direitos (“reformas”); o combate ao crescente autoritarismo judiciário e policial, especialmente na repressão de greves e movimentos sociais; e barrar o crescimento da extrema-direita truculenta e fascista. Para encaminhar tais tarefas, se faz urgente que os setores mais politicamente conscientes da classe trabalhadora construam comitês de mobilização e auto-defesa em seus locais de trabalho, estudo ou moradia, articulando a formação de uma frente nacional de lutas que mobilize cada vez mais trabalhadores (com ou sem suas lideranças pelegas), unificando sindicatos, movimentos sociais e partidos e grupos de esquerda, rumo à construção de uma greve geral por tempo indeterminado que derrube as “reformas” e force a burguesia a recuar.

Uma vez na ofensiva, os trabalhadores devem lutar ainda pelo direito democrático básico de eleição dos membros do judiciário e de equiparação do salário dos magistrados e parlamentares ao salário médio de um trabalhador qualificado; pelo direito de organizarem autodefesas contra abusos policiais e ataques da extrema-direita; pelo fim das forças especiais de repressão, como a Polícia Militar; bem como pela estatização sem indenização das grandes empresas, bancos e latifúndios, para que sejam os patrões que paguem pela crise criada por sua própria ganância. Mas para além disso, é fundamental que tenham como norte a construção de um governo direto dos próprios trabalhadores (consolidando, assim, uma revolução socialista). Ao menos é esse o programa que nós do Reagrupamento Revolucionários defenderíamos no interior de uma frente única de resistência de luta, que encaramos ser urgente criar.

Os maiores obstáculos às tarefas de resistência ao que será o governo Bolsonaro são: de um lado, a conciliação de classes e o apego à institucionalidade burguesa do PT e do setor majoritário do PSOL, que não apostarão na via da mobilização proletária e, ao invés, seguirão espalhando ilusões na via eleitoral e na falsa possibilidade de um capitalismo “humano e democrático”; de outro lado, e o imobilismo proposital das burocracias à frente dos sindicatos e centrais sindicais, que consistem em parasitas vivendo do suor dos trabalhadores e que tem horror à mobilização, pois toda luta abre a possibilidade de a base atropelá-las e gerar novas lideranças que as substituam, além de “dificultar a vida” no que tange as suas negociatas com os patrões e governos.

Embora não cheguem a constituírem obstáculos, quando pequenos grupos socialistas se colocam à reboque do petismo e da direção do PSOL (PCB e “esquerda do PSOL”, como Resistência, Insurgência, CST, LSR, EM), cumprem um papel contraditório em dar certa cobertura “pela esquerda” ao projeto de conciliação de classes defendidos majoritariamente pelo PT e PSOL, de forma que alimentam a ilusão de que tais setores sejam capazes de promover uma luta consistente contra os ataques promovidos pelo governo Bolsonaro, quando na verdade apenas pretendem desgastá-lo com fins eleitorais. Enquanto tais grupos passaram os últimos anos legitimando a conciliação de classes defendida pelo PT, PCdoB e majoritária do PSOL, outros propuseram falsas soluções que não rompem com o capitalismo e a “democracia” dos ricos, como  “Assembleia Constituinte” (MRT-Esquerda Diário) ou ainda realizando ziguezagues entre o sectarismo e o oportunismo (PSTU, ora pedindo “Fora todos”, ora “Eleições Gerais”, não se opondo à prisão de Lula, mas depois votando em Haddad). [11]

É, contudo, interesse de toda esquerda socialista que a classe trabalhadora se desvencilhe das ilusões da colaboração de classes, de forma que as organizações que se identifiquem como tal tenham a possibilidade de cumprir um importante papel na organização do proletariado na resistência aos ataques vindouros. Mas para que isso se torne uma realidade, a esquerda socialista não pode ficar na espera do PT ou da ala majoritária do PSOL para que alguma luta seja criada, é preciso que os próprios socialistas se proponham a chamar e organizar tais lutas sem se preocupar se isso agrada ou não aos grupos que optam pela conciliação, ou seja, é preciso que a esquerda socialista se proponha a construção de uma Frente Única, pois só assim teremos chances de resistir aos ataques promovidos pelo atual governo e combater a influência da ideologia burguesa no movimento dos trabalhadores.

Nem uma frente de lutas e nem uma greve geral sairão do mundo das ideias se a esquerda socialista continuar a reboque e na expectativa de ações do PT, da maioria do PSOL e demais defensores do projeto de colaboração de classes, cuja maior parte já aposta em uma “frente democrática” (um bloco político podre entre o PT, PCdoB e até partidos burgueses tradicionais como PDT, REDE e PSB), ao invés de uma frente única dos sindicatos, movimentos sociais e partidos e grupos de esquerda para mobilizar a classe trabalhadora. Enquanto durar o capitalismo, continuarão a existir crises econômicas, miséria, guerras e reacionarismo. E enquanto continuar a crise econômica no Brasil, os ataques da classe dominante contra o povo e em especial contra os trabalhadores vão continuar, porque não é possível conciliar os interesses desses setores, podendo levar ao fortalecimento da extrema-direita e de grupelhos fascistas.

Só um governo direto dos trabalhadores, baseado na socialização das riquezas – é uma alternativa real e duradoura. Por isso se faz fundamental a construção de um partido socialista revolucionário.  O único caminho pra um partido como esse é construindo um novo núcleo marxista que combine a luta contra a influência burguesa dentro do movimento socialista com a luta contra a burguesia, e se esforçando para unificar os movimentos socialista, operário e sociais da única forma correta – na organização de uma verdadeira luta contra os ataques patronais e o autoritarismo. O objetivo do Reagrupamento Revolucionário é precisamente contribuir para essa tarefa, reagrupando sob um programa socialista revolucionário indivíduos e organizações que estejam enraizados na classe trabalhadora e nas suas mobilizações e, assim, venham a formar a espinha dorsal do futuro partido revolucionário da classe trabalhadora no Brasil.

NOTAS

[*] Ver nossa declaração sobre o assunto em https://rr4i.milharal.org/2019/01/23/abaixo-as-ameacas-contra-a-venezuela-nenhuma-confianca-no-regime-autoritario-de-maduro
[1] Para nossa análise eleitoral, ver http://rr4i.milharal.org/2018/09/30/as-eleicoes-e-a-crise-politica/
[2] https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,apos-bancada-evangelica-vetar-educador-bolsonaro-anuncia-colombiano-para-educacao,70002617911
[3] https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,reacao-arabe-a-declaracoes-de-bolsonaro-pode-ter-impacto-nas-exportacoes,70002588037 e https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2018/11/contra-o-globalismo-e-o-pt-conheca-frases-do-novo-chanceler-brasileiro.shtml 
[4] https://brasil.elpais.com/brasil/2018/11/18/opinion/1542540844_607022.html
[5] https://oglobo.globo.com/rio/justica-autoriza-estado-vender-cedae-23311243?fbclid=IwAR227ugG1ALRx4PrpQMtOuAln8B1oBa-oDi6zPZZf2wmYPwp2htcu9SVvPw
[6] https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/31/politica/1535667568_741528.html
[7] Conforme https://g1.globo.com/politica/noticia/2018/12/13/tse-rejeita-acao-do-pt-que-pedia-investigacao-da-chapa-de-bolsonaro-por-abuso-de-poder.ghtml?fbclid=IwAR2mouhRg_y_kZnFSiU-H1I4eYYJQOE2Z9wMA3wjv-BQhfXSMdvK8foLRSY e https://veja.abril.com.br/politica/moro-diz-ter-confianca-pessoal-em-onyx-que-admitiu-caixa-dois/ e https://veja.abril.com.br/politica/para-moro-bolsonaro-ja-esclareceu-caso-de-ex-assessor-do-filho/
[8] Conformehttps://twitter.com/Haddad_Fernando/status/1056887442115047426?ref_src=twsrc%5Etfw; https://twitter.com/GuilhermeBoulos/status/1074250517268840448 e https://brasil.elpais.com/brasil/2018/12/17/politica/1545056931_483830.html
[9] Para uma análise detalhada, ver http://rr4i.milharal.org/2017/05/12/2852/
[10] Para uma análise detalhada, verhttp://rr4i.milharal.org/2018/05/26/observacoes-preliminares-da-greve-dos-caminhoneiros/ e http://rr4i.milharal.org/2018/06/18/unidade-com-os-caminhoneiros-em-defesa-dos-interesses-dos-trabalhadores-e-estudantes-panfleto/
[11] Para uma crítica detalhada, ver https://rr4i.milharal.org/2017/03/10/a-esquerda-ante-a-crise-brasileira/