Mateusz Malesa, Presente!

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É com o coração pesado que registramos que, após anos de luta contra a depressão, o simpatizante polonês do Reagrupamento Revolucionário, camarada Mateusz Malesa (que usava os pseudônimos de Félix Domański e M. Krakowski), tirou a própria vida com a idade de 25 anos. Ele será lembrado entre outras coisas por seu humor, inteligência e sagacidade política. Um trotskista declarado, ele lutou arduamente até o fim de sua vida pelo projeto da revolução proletária, mesmo na monstruosa maré reacionária da Polônia. Deixará muita saudade.

Na adolescência, Mateusz deixou o anarquismo para se tornar simpatizante da Tendência Comunista Internacionalista, uma pequena organização ultra-esquerdista que reivindica o marxismo, e com a qual ele trabalhou em traduções de artigos para o polonês e também escrevendo artigos próprios. Ele havia sido repelido do trotskismo pelas correntes que o reivindicam deturpando o pensamento de Trotsky para enquadrá-lo às suas necessidades oportunistas. Ele percebeu depois que havia mais em Trotsky e no trotskismo do que os reformistas tinham a oferecer, assim como a validade da análise de Trotsky sobre os Estados burocratizados degenerados e deformados contra a teoria do “capitalismo de Estado”. Ao relembrar sua evolução política nesse momento, ele notou: “Eu cheguei à conclusão de que a minha posição naquele momento era uma versão tacanha de trotskismo, e resolvi aceitar a versão original”.

Tendo sido ganho para o trotskismo, ele encontrou pouco depois o Reagrupamento Revolucionário, e logo se tornou um simpatizante. Nos últimos anos, ele tomou uma parte ativa em traduzir muitos dos nossos artigos para o polonês, assim como escreveu vários artigos sobre a situação polonesa e internacional. Conhecendo polonês, inglês e um estudante de português, Mateusz desempenhou um papel incrivelmente importante nessas traduções, permitindo às nossas posições atingirem uma audiência mais ampla no mundo. Além de uma presença literária, ele também interviu em muitas manifestações com nossos materiais em mãos, propagando o comunismo no difícil cenário polonês. Nos seus meses finais, ele também ajudou os camaradas do Bolshevik-Leninist da Austrália, e começou a colaborar politicamente com eles antes de sua vida ser tragicamente encurtada.

Mateusz era um comunista dedicado. Apesar de sua precária situação de vida e condições pessoais terem levado a momentos de desilusão com o projeto comunista, ele continuou a trabalhar para esse objetivo. Ele foi de grande ajuda para o nosso trabalho de reagrupamento internacional, e seus escritos e traduções continuarão a nos ajudar nessa tarefa. Ele não será esquecido e seu trabalho seguirá vivo, honrando sua memória.

O relato abaixo sobre Mateusz foi escrito por um camarada do projeto Bolshevik-Leninist da Austrália:

Eu conheci Mateusz (ou Félix, como ele se denominava no Facebook) quando comecei a me aproximar do Reagrupamento Revolucionário politicamente. Embora no princípio as nossas conversas fossem breves e infrequentes, isso logo mudou e nós nos aproximamos num nível pessoal. Não demorou muito para que eu o abordasse com uma variedade de perguntas sobre suas visões a respeito de uma ampla gama de tópicos. Desde eventos atuais e passados, até vídeo games e questões da vida, não havia fim para os temas sobre os quais conversávamos. Ele me falava sobre seus problemas pessoais e eu compartilhava os meus. Tínhamos um bocado em comum e podíamos nos solidarizar quanto a isso. Eu não era o mais experiente nesse tipo de questão, mas tentei aconselhá-lo com seus problemas da melhor forma que pude. Esperava que ele recebesse meus conselhos de coração aberto, ainda que por um breve momento. Ele era um jovem honesto que tinha como diversões ler e jogar vídeo games, nos quais encontrava alívio dos problemas da sua vida, comentando certa vez que: “Quando eu jogo vídeo games, os pensamentos se interrompem e eu me sinto relativamente em paz; quando eu paro, eles voltam rapidamente”.

Ele era incrivelmente estudado, e apesar de jovem, tinha, na minha visão, mais experiência política do que eu poderia sonhar em ter. Manter-se como um comunista ativo na Polônia é uma tarefa hercúlea, e eu tinha imenso respeito pela habilidade dele em nadar contra a corrente. Ele era um escritor e tradutor extremamente dedicado, especialmente levando em conta suas dificuldades pessoais, e sua ética com o trabalho era algo impressionante. Nesse quesito, eu desejava, e ainda desejo, ser mais como ele no futuro.

Ambos sofríamos do mal que é se envolver em muitas discussões nos círculos de esquerda no Facebook (“Leftbook”), não conseguindo não ler e se espantar com todo o horrível oportunismo que ecoa nessa parte lamentável da internet. A partir disso, criamos um laço no qual encontramos conforto ao desabafar um com o outro sobre essa ou aquela posição política horrenda. Ele era geralmente a primeira, e muitas vezes a única pessoa com a qual eu podia desabafar e zombar dessas posições. Ele nunca deixava de ter um comentário espirituoso e tinha um discurso afiado contra esses tipos.

Eu me lembro de uma vez quando ele me mandou uma mensagem sobre um fórum no qual estava discutindo com ultra-esquerdistas que haviam deturpado uma citação de Trotsky para justificar a posição de que a URSS era imperialista, e falou que “Eu poderia estar jogando ‘Conan Exiles’ ou traduzindo um artigo do RR, mas em vez disso estou aqui debatendo com eles”. Foram sábias palavras. Eu acho que cedo ou tarde eu segui o conselho dele e comecei a me afastar rumo a atividades mais proveitosas ou produtivas em vez dessas discussões inúteis na internet. Deve-se escolher as batalhas políticas com sabedoria, priorizando aquelas que envolvem fazer avanços reais para o marxismo, o que geralmente inclui debater com pessoas honestas e sinceras, que por vezes são raras em fóruns da internet.

Ele não era muito habilidoso em vídeo games, o que, se eu tivesse que escolher algo para não ser bom, provavelmente seria isso. Mas ele se distraía com eles, e tinha amplo conhecimento sobre vários jogos. Houve uma ocasião em que ele me contou sobre um jogo, “Hearts of Iron IV”, no qual ele fez com que Trotsky liderasse a União Soviética, e tinha conseguido a vitória do proletariado na Espanha e instigar a revolução na França. Eu esperava poder algum dia jogar um desses jogos com ele quando minha agenda ficasse mais livre. Eu sempre estava muito estressado e atarefado com estudo, mas hoje algumas dessas tarefas parecem menores no grande esquema das coisas.

Eu sempre imaginei um dia encontra-lo pessoalmente, apertar sua mão e ter refeições juntos, falar sobre política e mesmo sair para beber. Ele era um camarada tímido, mas acho que em boa companhia ele iria se abrir, assim como uma primeira flor solitária no início da Primavera se abre ao amanhecer; a primeira de muitas conforme a Primavera continuasse.

Algumas noites atrás, eu acordei de um sonho no qual ele estava bem, estava apenas tirando um tempo da internet. Ele tinha voltado, ainda estava triste, mas estava melhorando. Não posso explicar a sensação de alívio que senti. Por um minuto achei que ele havia partido, mas agora estava de volta, e eu tinha muito a lhe dizer. Queria perguntar sobre o que pensava dos protestos nos EUA, se não eram um farol de esperança para a revolução mundial. Eu queria conversar sobre a política desta ou daquela organização; queria dizer que lamentava muito que ele não tinha sido capaz de tirar as férias em Portugal que ele havia planejado antes do isolamento e lockdown causados pelo coronavírus. Ele ficou devastado por ficar trancado em casa por meses. Isso o atingiu muito severamente. Eu queria dizer a ele de novo que se ele conseguisse aguentar só um pouco mais, eu tinha certeza que ele conseguiria prosseguir para esse recesso tão necessário da sua vida em casa. Mas no fim, era apenas um sonho.