Arquivo Histórico: Liga Espartaquista e a Autodefesa Operária

Família Negra Ameaçada em Chicago
Regional do UAW Organiza Autodefesa Negra e Operária

Publicado originalmente em abril de 1975 pela Liga Espartaquista (Workers Vanguard número 67). A tradução para o português foi realizada pelo Coletivo Comunista Internacionalista em 2007. Esta versão foi copiada daquela disponível em coletivolenin.org.

Chicago, 18 de abril de 1975 – C. B. Dennis, negro e membro do UAW (Sindicato Unido dos Trabalhadores Automobilísticos), tentou se mudar para o bairro de classe média branca de Broadview. A sua casa foi queimada e apedrejada repetidas vezes. Mas hoje à noite, como em todas as noites desde a semana passada, a casa da família Dennis está sendo protegida por uma auto-defesa inter-racial de seus companheiros sindicalistas. A regional 6 do UAW votou unanimemente, na sua assembléia de domingo, organizar a auto-defesa.


Num momento em que há um aumento dramático do terror racista contra os negros em todo o país, a ação da regional do UAW é um poderoso exemplo do que pode ser feito para parar os ataques noturnos. E esta é a melhor resposta possível para os que pregam a confiança na polícia da burguesia, se escondendo atrás do lamento desesperado: “os trabalhadores não vão defender os negros dos ataques racistas – não existe solução a não ser chamar a polícia”.

Os ataques, que causaram um prejuízo de milhares de dólares à casa, e impediram a família de se mudar, são parte de um padrão de terror contra os negros nos bairros brancos, onde a direita tenta espalhar o ódio racial. Em outra vizinhança, na Zona Sul, quatro famílias negras foram forçadas a viver virtualmente sob estado de sítio, com o Partido Nacional-Socialista do Povo Branco (Nazista) fazendo tudo, menos assumir os ataques.
  
Os primeiros voluntários da regional 6, incluindo o presidente local, Norman Roth, estavam a postos do lado de fora da casa, poucas horas depois da assembléia. C. B. Dennis, que trabalha na manutenção na planta da International Harvester de Melrose Park há 15 anos, foi entrevistado em casa pelo jornal Workers Vanguard [jornal da Liga Espartaquista]. Ele falou que não conseguiu proteção policial adequada.
  
“Eles falaram que iam chegar em vinte minutos. Mas não tem proteção nenhuma” Dennis falou, observando que só acontecem patrulhas de duas em duas horas à noite. “Isto é a melhor coisa que poderíamos fazer”, disse, referindo-se à auto-defesa, “Eu estou realmente orgulhoso do sindicato hoje. Eu acho que isso é uma grande coisa”. Um velho trabalhador negro que estava ouvindo concordou, dizendo que não conseguia lembrar de uma ação como essa feito pelo sindicato em toda a sua história. Ele comparou com as atividades de auto-defesa das campanhas em que participou nos anos 1930.
  
A ação de auto-defesa da regional do UAW recebeu uma atenção considerável em Chicago. Apareceram artigos na segunda-feira nos dois jornais diários, e Dennis e os dirigentes da regional 6 foram entrevistados por dois canais de televisão à noite. Também houve, no mínimo, três reportagens no rádio.
  
Na segunda noite, os sindicalistas foram xingados por passantes, e um vizinho a duas casas de distância mandou-os “para o inferno”. Outro morador branco, entretanto, veio mais cedo para conversar com Dennis por vinte minutos, expressando simpatia e dizendo que algumas pedras também atingiram a sua casa.
  
É evidente que a polarização racial é profunda, mas a vizinhança não chegou ainda a ser toda aterrorizada. Os voluntários da regional 6 falam em impedir outra mobilização racista, como aconteceu em Boston. Não houve novos ataques desde que o grupo de voluntários começou a vigiar a casa diariamente. A base votou que eles devem ficar “o tempo que for necessário” para assegurar que a família se mude com segurança para a casa.
  
Os ataques a famílias cresceram desde uma ofensiva organizada dos grupos fascistas e racistas de Chicago. Além dos ataques a quatro famílias negras na Zona Sul, houve ataques anteriores a outras famílias em Broadview. O Partido Nazista lançou candidatos para xerife em cinco distritos nas últimas eleições, e a Ku Klux Klan recentemente também esteve se organizando mais ativamente.
  
Esta escória se aproveita do desespero causado pelos altos índices de desemprego e inflação na classe trabalhadora, e seus esforços para dividir os trabalhadores pelas suas raças só podem beneficiar os patrões. Ações corajosas, como a feita pela regional 6 podem, se prosseguirem e forem adotadas pelo resto do movimento operário, impedir futuros ataques e, rapidamente, mandar o pequeno mas mortal movimento fascista para a sepultura que ele merece.
  
O terceiro ataque à casa de Dennis, que aconteceu dois dias antes da assembléia, revoltou particularmente muitos membros da regional. A moção para organizar as auto-defesas voluntárias foi feita por um membro da Corrente de Luta Operária, que distribuiu um boletim na planta da empresa antes da assembléia, chamando uma resposta militante à onda de terror racista. A Corrente de Luta Operária é um agrupamento na regional 6 com um programa classista que esteve ativo, recentemente, em lutas bem-sucedidas contra a proibição de panfletagem na planta pela empresa, e contra a extensão dos mandatos dos representantes sindicais para três anos. A sua resolução na assembléia de domingo apoiava a “luta pela integração dos negros na moradia, na educação e nos empregos” como “um interesse vital de todos os trabalhadores”, e denunciava a confiança na polícia, que “serve aos patrões, e da qual não podemos depender para defender os direitos dos negros ou dos sindicatos”. A moção também exigia que as auto-defesas fossem estendidas às famílias negras da Zona Sul, assim como de Broadview.
  
Depois da assembléia, a regional lançou um número especial de seu boletim. Embora ele não tenha sido bem distribuído, uma reunião especial na terça-feira foi assistida por 25 membros de todas as correntes políticas da regional, assim como por um canal de televisão, que filmou tudo. O presidente Roth estava na mesa e recebeu várias críticas pela distribuição ineficiente do boletim especial da regional que, foi dito, faria a reunião ser bem maior.
  
Ele também voltou atrás, sob pressão, da sua objeção anterior à formação de um comitê especial para organizar as auto-defesas. Um comitê foi então formado, sob a direção do sindicato. Ele inclui dois membros da Corrente de Luta Operária, um membro do grupo sindicalista Voz Operária, e outros membros da regional. Os membros do comitê imediatamente começaram a procurar voluntários na planta.
  
Houve apoio à atividade de auto-defesa, pelo menos verbalmente, pela direção do UAW na área, incluindo o diretor regional Robert Johnston. O boletim especial da regional declarou que “estes esforços estão de acordo com os princípios e políticas do UAW”.
  
Por outro lado, a direção do UAW pareceu preocupada, em primeiro lugar, em conseguir a intervenção do governo, tirando assim a responsabilidade das mãos do sindicato. Na casa de Dennis no domingo à noite, Roth disse ao Workers Vanguard que a sua intenção era “exercer toda a pressão política para obrigar as autoridades a fazerem alguma coisa”. Depois, ele disse que “Em alguns casos, a polícia deu alguma proteção”.
  
Roth, que é um famoso apoiador dos Sindicalistas por Ação e Democracia, o grupo sindical apoiado pelo reformista Partido Comunista, não surpreende ao confiar no Estado dos patrões. Nem a justiça, nem a polícia, o exército ou a Guarda Nacional vão proteger os negros da violência racista. Isso pode ser visto claramente pela situação de Boston, onde a justiça está conciliando com os racistas e dando um passo gigantesco para trás na questão do plano contra o apartheid nos ônibus.
  
Em Boston, houve duas linhas fortemente opostas sobre a questão de como defender os negros dos ataques racistas. De um lado, estavam os liberais, com o Partido Comunista e o SWP [que na época era seção do Secretariado Unificado (SU), corrente internacional reivindicada pelo Enlace/PSOL], que exigiram as tropas federais. Contra esta confiança mortal nas forças armadas do Estado capitalista, a Liga Espartaquista lutou por auto-defesas inter-raciais. Em Chicago, Boston, ou em qualquer lugar, as autodefesas negras e operárias podem eliminar rapidamente os terroristas racistas, neutralizar os elementos oscilantes da população branca e, finalmente, desmobilizar manifestações racistas.
  
A ação da regional 6 poderia ser o início de uma resposta militante e classista ao terror racista na grande Chicago, mas somente se toda a regional, incluindo a direção, trabalhasse seriamente nela e espalhasse a idéia para as outras regionais. Se a direção da regional 6, em vez disso, semeia ilusões no Estado, isso vai abrir o caminho para a piora da polarização racial. A auto-defesa não pode ser encerrada prematuramente, com a promessa de que o exército ou a polícia vão ser garantidos pelo Estado.