Qual deve ser a política dos revolucionários na Venezuela?
Direita promove mais uma jornada de lutas contra o “chavismo”
Qual deve ser a política dos revolucionários na Venezuela?
Escrito pelo antigo Coletivo Comunista Internacionalista (CCI), organização predecessora do extinto Coletivo Lenin – Junho de 2008
A situação política na Venezuela tem despertado reações de fúria por parte da direita e confusão por parte da esquerda.
Desde que assumiu o governo, Hugo Chávez tem feito duros discursos atacando os Estados Unidos e tem enfrentado a resistência da direita venezuelana e mundial.
Até hoje, a Venezuela foi o único país da América Latina a conseguir, através da mobilização dos trabalhadores, reverter um golpe militar orquestrado pelos Estados Unidos. Entretanto, mesmo após a demissão de alguns generais, ainda há militares golpistas no exército. Chávez tenta enfraquecer esse setor reformando as forças armadas e, ao mesmo tempo, organiza milícias para resistir em armas caso aconteça uma nova tentativa de golpe. Paralelamente a isso, os Círculos Bolivarianos tentam manter os moradores das favelas e periferias convencidos da necessidade de defender a constituição e o governo. Isso seria um “escudo humano” capaz de prevenir novas tentativas de golpes e intimidar mobilizações da direita.
Diante desse processo, muitos ativistas sinceros acreditam que Chávez esteja realmente construindo o socialismo.
Nós, revolucionários, não acreditamos que o socialismo possa ser construído através de reformas constitucionais. Pelo contrário, o socialismo só se constrói pela via revolucionária colocando abaixo os poderes do Estado: Executivo, Legislativo, Judiciário, Forças Armadas e Polícias. No lugar dos poderes da burguesia deve ser construído um Estado operário baseado na democracia operária, ou seja, todo o poder nas mãos dos organismos de deliberação construídos pela própria classe trabalhadora e protegido pelas milícias revolucionárias dos trabalhadores. Por isso, não cremos que o chavismo seja o caminho para o socialismo.
Por outro lado, não podemos deixar de admitir que o governo Chávez tem enfrentado uma feroz oposição da direita. Na Venezuela, a redução da jornada de trabalho sem redução dos salários, possibilitou a criação de mais de 150 mil novos empregos. A não renovação da concessão da RCTV representou um golpe em um setor da imprensa que é tão ou mais podre que a Rede Globo no Brasil. Reconhecemos: devemos lutar para manter e ampliar essas conquistas. Porém, não podemos ter ilusões de que medidas como essas podem prescindir a revolução proletária e, sozinhas, conduzir a Venezuela ao socialismo. O que está em jogo na Venezuela não é socialismo ou capitalismo, mas a arrogância da direita golpista que não é capaz de tolerar nenhuma conquista dos trabalhadores.
Desde a fracassada tentativa de golpe em abril de 2002, a direita mais reacionária passou a buscar a “via democrática” para assumir diretamente o controle da Venezuela. Por isso, a organização com tendências de direita chamada Bandera Roja convocou recentes mobilizações estudantis contra o governo. É algo parecido com as manifestações que o “Movimento Cansei” tentou fazer no Brasil.
A principal bandeira dessas mobilizações é a vitória do “NÃO” no referendo de 2 de dezembro. Dizem que caso o “SIM” seja vitorioso, a Venezuela se transformará em uma ditadura, pois seria possível a reeleição indefinida de Chávez. Curiosamente, muitos outros países permitem a reeleição indefinida e, nem por isso, são chamados de ditaduras. Na verdade, o que a direita venezuelana não tolera é que, além dessa medida, a reforma constitucional visa acabar com a autonomia do Banco Central e proclamar o prosseguimento das nacionalizações nos setores da energia e do petróleo.
Tudo isso tem deixado a esquerda mundial muito confusa. Alguns, equivocadamente, acreditam que Chávez seja o caminho para o socialismo. Outros, no afã de denunciar que Chavéz não pode construir o socialismo, acabam fazendo um oposição tão vazia de conteúdo político que acaba por reproduzir os mesmos argumentos da direita golpista venezuelana.
No caso das recentes mobilizações da direita contra o governo, algumas correntes de esquerda, inclusive no Brasil, fizeram declarações de apoio aos atos contra o governo. Esquecem que estão manifestando apoio ao setor golpista e reacionário da Venezuela.
Nós do CCI, ao contrário, dizemos que não temos nenhuma confiança no governo Chávez. Porém quem deve fazer oposição a ele é o movimento operário e socialista, e não a direita. Temos levantado a palavra de ordem “Oposição Revolucionária ao governo Chávez”. Isso significa que a oposição de ser feita pelos revolucionários apoiados no movimento operário.
Afirmamos que a direita golpista não tem moral pra atacar governo nenhum e muito menos o governo Chávez. Por isso, nessas mobilizações, nos alinhamos com aqueles que militam para destruí-las, pois são manifestações reacionárias e golpistas.
Além disso, repudiamos com veemência a atitude de algumas organizações, como o PSTU, que tem apoiado essas manifestações e orientado sua seção na Venezuela a participar delas. Esse é um desvio grave, pois significa estar na trincheira do inimigo. Torna-se mais grave ainda na medida em que essas mobilizações têm terminado em confrontos armados. No Brasil, se houvesse uma mobilização do “Cansei” contra o governo Lula e a Central Única dos Trabalhadores se confrontasse com tal movimento, estaríamos na trincheira da CUT (que é uma organização de trabalhadores) contra a direita reacionária. Na Venezuela o sectarismo do PSTU tem levado esse partido a estar na trincheira do Bandera Roja. Esse é um erro muito grave, pois ultrapassa as fronteiras de classe.
Fazer oposição revolucionária ao governo Chávez significa, sem dar o mínimo apoio a esse governo, não ser sectário e fazer unidade de ação com ele para derrotar a direita e todos os seus movimentos. Aproveitando as mobilizações dos trabalhadores e moradores de favelas contra a direita, os revolucionários na Venezuela devem exigir, através dos métodos de luta próprios da classe operária, a expropriação sem indenização de todas as empresas venezuelanas, a nacionalização total das energias e o controle operário sobre a PDVSA. Sem dúvida alguma, essa pauta se chocaria com os golpistas e também com o próprio Chávez. Toda essa luta estaria a serviço da construção de um Partido Revolucionário de Trabalhadores na Venezuela como parte da batalha pela reconstrução da Quarta Internacional e por um governo direto dos trabalhadores venezuelanos.
Uma oposição como essa seria uma poderosa ferramenta capaz de destruir as ilusões daqueles que acreditam ser Chávez o caminho para o socialismo.
O sectarismo, por sua vez, em situações de confronto aberto, como na Venezuela, terminam mostrando sua outra face: o oportunismo e a colaboração com a direita. Aqueles que se colocam contra o governo Chávez, mas reproduzem os ataques da direita, conseguirão apenas ajudar o setor mais reacionário e, depois disso, serem rechaçados pelo movimento operário. E, quando isso acontecer, de nada adiantará montar um aparato próprio para dizer que a direção da classe está em disputa, pois a política acontece no mundo real e não no mundo dos factóides.