A Escola Stalinista de Falsificação Revisitada (6)
6. A Terceira Revolução Chinesa
O ponto central na série do Guardian sobre “O Legado de Trotsky” é a simples afirmação: “A história provou que Mao estava correto”. A revolução chinesa, de acordo com Davidson, é o modelo para os países atrasados e coloniais. O grande farol do pensamento de Mao Tse-tung mostraria o caminho. Será mesmo?
Vamos primeiro tratar do mito de Mao, o grande líder proletário que sempre lutou pela ditadura do proletariado, em oposição a traidores como Liu Shao-chi, que tentaram dissuadi-lo. Em um artigo anterior, Davidson escreveu que em 1927 “a Comintern reivindicou uma política posta em prática por Mao de forma independente, e ignorada ou oposta por ambos Tu-hsiu [dirigente principal do Partido Comunista Chinês na época] e Chang Kuo-tao”. Nada poderia estar mais distante da verdade. Em primeiro lugar, Chen infelizmente seguiu simplesmente as ordens de Moscou, mesmo quando ele discordava completamente; ele não possuía o espírito proletário para se recusar a obedecer a ordens mesmo quando estas literalmente mandariam milhares de camaradas chineses para seus túmulos.
Segundo, é para o crédito de Mao o fato de ele ter se recusado a seguir instruções da Internacional Comunista entre 1926-27, durante a Expedição para o Norte do general Chiang Kai-shek, quando Moscou queria que ele controlasse as lutas de massa a todo custo. Em 26 de outubro de 1926, Stalin havia mandado um telegrama ordenando que o movimento camponês fosse contido para que não espantasse os generais do Kuomintang que, afinal, eram eles próprios latifundiários. Mao recebeu do Comitê Central do partido a tarefa de executar essa ordem de contenção na província chave de Hunan. Ele imediatamente retornou para sua província natal e procedeu de forma exatamente oposta, levantando dezenas de milhares de camponeses para formar associações camponesas e tomar e redistribuir a terra que pertencia à aristocracia. Essa vasta onde de levante camponês ajudou enormemente a rápida marcha para o norte dos exércitos do KMT [Kuomintang]. Ela também deixou os generais “inquietos”, como se pode facilmente imaginar.
As políticas de Mao nesse período, entretanto, nem sempre eram mais militantes que a da liderança do PC. No outono de 1924, ele foi removido do Politburo do partido em razão da sua ligação excessivamente próxima dos círculos da ala direita do Kuomintang. Mas o padrão mais geral de “protesto” de Mao contra uma política da qual ele discordava era simplesmente ir para as montanhas e aplicar as políticas que considerava corretas. Quando um telegrama da Comintern em 31 de março de 1927 ordenou que o partido em Shangai e os sindicatos escondessem suas armas quando os exércitos de Chiang estavam nos portões da cidade, o resultado inevitável foi um massacre de dezenas de milhares de militantes. Chen protestou mas seguiu as ordens suicidas. Mao nunca protestou.
Durante os anos 1930, Mao entrou em conflito com a liderança do partido a respeito da política de reforma agrária na região “soviética camponesa”. Wang Ming, então líder do PC, acusou Mao de ter uma “linha a favor dos camponeses ricos”, porque ele simplesmente chamou pela redistribuição igual da terra, dando-lhes fatias iguais, e não pelo confisco da terra dos camponeses ricos. Seria mais preciso chamar isso de uma linha a favor dos camponeses médios, já que os camponeses ricos (kulaks na Rússia) geralmente se opõem a levantes violentos e, em vez disso, preferem soluções graduais que lhes permitem maiores oportunidades de acumular terra e capital. São os camponeses médios que tem mais a ganhar com uma eliminação radical da classe de latifundiários feudais, e historicamente foram os camponeses médios que defenderam tais esquemas de uma “redistribuição cega” da terra. Eles foram os líderes da revolta camponesa russa do verão e do outono de 1917.
Mais importante, entretanto, é que essa é a mais radical reforma agrária que pode ser realizada sem reorganizar totalmente os vilarejos. Guerra de guerrilhas depende do apoio geral da população camponesa, não apenas dos mais pobres dentre os pobres, já que guerrilheiros isolados e mal equipados são extremamente vulneráveis a traição. E diante de armas modernas, a única arma dos camponeses é o seu número esmagador, que novamente presume unidade. Não é acidente que todos os movimentos de guerrilha optam por uma política adaptada aos camponeses médios – ou ricos – ao invés de levar a luta de classe até os vilarejos; e é mais uma razão pela qual os marxistas revolucionários insistem que o proletariado é a única classe consistentemente revolucionária, e se opõem ao guerrilherismo como método.
Período da “Frente Única Anti-japonesa”
Mas Mao não era apenas um astuto líder de guerrilha. Gradualmente, ele chegou a um entendimento bastante claro da essência do stalinismo – capitulação à burguesia enquanto se mantém controle burocrático sobre os trabalhadores e camponeses pobres. Assim, quando ele finalmente obteve predominância no Comitê Central do PC, ele foi o mais energético defensor de uma segunda “frente única” com o Kuomintang, seguido à Longa Marcha. Isso correspondeu à mudança de linha no Sétimo Congresso da Internacional Comunista e ao período de Frente Popular.
Pouco depois, em 1º de agosto de 1935, o PC chinês lançou um apelo a todas as classes patrióticas para se juntarem aos comunistas e lutar contra o Japão. Alinhado com a nova política de frente popular, Mao lançou novas instruções de moderar a política agrária para poder receber apoio dos camponeses médios e ricos. A declaração do Politburo de 25 de dezembro de 1935 dizia:
“A República Popular Soviética mudará sua política em direção aos camponeses ricos; a terra de camponeses ricos, exceto aquela porção com exploração feudal, independente de estar sob próprio cultivo ou ser cultivada por trabalho contratado, não será confiscada. Quando a terra estiver sendo igualmente distribuída em um vilarejo, camponeses ricos terão o direito de receber a mesma parte de terra que camponeses pobres e médios.”
Agora aqui está uma verdadeira política para o camponês rico. Seis meses depois ela foi amplificada por uma declaração do Comitê Central: “As terras dos soldados da luta anti-japonesa e daqueles envolvidos em empreitadas anti-japonesas não será confiscada”. Isso permitia até mesmo aos maiores latifundiários reter suas terras através do simples mecanismo de alistar um filho no Exército Vermelho.
Essa política para a questão da terra também tinha seu equivalente em nível político. O “Governo Soviético Operário e Camponês” se tornou a “República Popular Soviética”, que proclamou:
“Ela [a “República Popular”] está disposta a ter a ampla unidade da classe pequeno-burguesa com as massas nesse território. Todos os elementos de classe pequeno-burguesa revolucionários receberão o direito de votar e de serem eleitos no soviete”.
Nesse meio tempo, no outono de 1936, foram emitidas ordens de banir o uso do nome “Partido Comunista” ao nível dos subdistritos, substituindo-o por “Associação de Salvação Nacional Anti-japonesa”.
Tendo indicado a sua disposição a capitular, o PC chinês enviou um telegrama para o KMT em 10 de fevereiro de 1937 propondo uma frente única. (Em anos recentes, os maoístas tem feito alarde dos escritos do “Grande Timoneiro” contra aqueles que apenas colocaram ênfase na frente única e não o suficiente no partido. Considerando os termos dessa “frente única patriótica”, foi uma traição aberta às massas simplesmente entrar nessa frente, apesar de os trotskistas terem dado apoio inequívoco à luta da China contra o Japão até o momento em que a luta pela independência nacional foi subordinada à Segunda Guerra Mundial). Em resposta à proposta do PC chinês, o Kuomintang adotou a “Resolução pela Completa Erradicação da Ameaça Vermelha”, que concordava com uma reconciliação se o Exército Vermelho e o governo soviético fossem abolidos, toda a propaganda comunista fosse encerrada e os chamados pela luta de classes abandonados. O PC chinês aceitou, apesar de que a real integração das áreas de base comunista ao domínio do Kuomintang, assim como a absorção do exército comunista, tenha ficado só no papel.
Com o início da Segunda Guerra Mundial, a colaboração de classes de Mao se tornou ainda mais explícita, se é que era possível. Ele rebatizou o “bloco de quatro classes” de Stalin com o slogan “Nova Democracia”, que era definida como a “ditadura de todas as classes revolucionárias contra os contrarrevolucionários e traidores”. Davidson cozinha uma versão açucarada da Nova Democracia, de acordo com a qual essa etapa intermediária só duraria até o fim da guerra civil, depois da qual “a revolução passaria de forma imediata e ininterrupta para a sua segunda etapa, do socialismo e da ditadura do proletariado”. (Guardian, 25 de abril de 1973). Mao nunca disse algo desse tipo. Pelo contrário:
“O progresso da revolução chinesa deve ser dividido em duas etapas: (1) a revolução democrática; (2) a revolução socialista (…). Quanto ao primeiro estágio, ou primeira etapa, nessa revolução colonial ou semicolonial, de acordo com sua própria natureza, é fundamentalmente ainda uma revolução democrático-burguesa na qual o requisito objetivo ainda é basicamente limpar o caminho dos obstáculos à frente do desenvolvimento capitalista…”.
“A revolução chinesa só pode ser alcançada em dois passos: sendo o primeiro aquele da nova democracia; o segundo aquele do socialismo. Além disso, o período da primeira etapa será consideravelmente longo a jamais pode ser concluído do dia para a noite.”
― “Sobre a Nova Democracia”, janeiro de 1940
Em outro documento desse período, Mao colocou a questão de forma ainda mais explícita:
“Por que nós chamamos a presente etapa da revolução de uma ‘revolução democrático-burguesa’? Porque o alvo da revolução não é a burguesia em geral, mas a opressão feudal e imperialista; o programa da revolução não é abolir a propriedade privada, mas proteger a propriedade privada em geral, e os resultados dessa revolução irão abrir o caminho para o desenvolvimento do capitalismo… Então a política de ‘terra para quem nela trabalha’ é uma política democrático-burguesa, não proletária ou socialista…”
“Sob o sistema de governo da Nova Democracia, uma política de reajuste das relações entre capital e trabalho será adotada. De um lado, os interesses dos trabalhadores serão protegidos. Um sistema de trabalho de oito a dez horas diárias (…) e direitos aos sindicatos de trabalhadores. Por outro lado, lucros razoáveis de empresas estatais, privadas e cooperativas serão garantidos (…) Nós acolhemos bem investimentos estrangeiros se eles foram benéficos para a economia da China…”
― “Sobre o Governo de Coalizão”, abril de 1945
Muito interessante a “passagem ininterrupta” ao socialismo do camarada Davidson. E quanto ao significado dessa “Nova Democracia” em termos econômicos e sociais, nós apenas temos que olhar para a política agrária forçada durante a “frente única anti-japonesa”, que continha medidas “progressivas” tais quais a seguinte:
“Reconhecer que a maioria dos latifundiários são anti-japoneses, que alguns da aristocracia esclarecida também são a favor de reformas democráticas. De acordo com isso, a política do partido é apenas ajudar o camponês a reduzir a exploração feudal, mas não liquidar a exploração feudal completamente…”
“… camponeses devem ser aconselhados a pagar os aluguéis e juros, assim como a proteger os direitos civis, políticos, econômicos e agrários do latifundiário.”
― “Decisão do Comitê Central sobre a Política Agrária nas Áreas de Base Anti-japonesa”, janeiro de 1942
E quanto a este conceito mítico e completamente antimarxista de uma ditadura revolucionária conjunta de todas as classes revolucionárias, Mao tinha algo bem específico em mente: um verdadeiro governo de coalizão com o pouco temeroso patriota anti-imperialista Chiang Kai-shek, no qual o KMT controlaria a maioria do governo e a vasta maioria das unidades militares. Esse acordo foi elaborado e aceito pelo PC chinês em uma “Conferência Política Consultiva”, em janeiro de 1946. O governo seria formado por 40 pessoas escolhidas por Chiang, metade do Kuomintang e metade de outros partidos (incluindo o PC chinês). Os exércitos nacionalistas seriam restritos a 90 divisões e as forças comunistas a 18 divisões, respectivamente. Foi apenas em razão da hostilidade a qualquer compromisso com os Comunistas por parte de certos setores do KMT, particularmente os militares, que esse acordo nunca foi implementado.
Portanto, por um período de 20 anos, desde o fim dos anos 1920 até fins dos anos 1940, Mao repetidamente buscou conciliar com a burguesia chinesa e até mesmo, às vezes, com elementos feudais, enquanto adotava doutrinas que são expressões clássicas da teoria menchevique de revolução em duas etapas. O fato de não ter havido nenhum desastre do tipo indonésio, com a liquidação do partido e assassinato de centenas de milhares de militantes, deveu-se somente ao fato de que o governo do KMT era tão corrupto que Chiang não podia dar-se ao luxo de arriscar um governo de coalizão. Mas a burguesia nem sempre é assim tão fraca. Logo após o massacre de Shangai, Chiang tinha sido capaz de estabilizar o domínio do Kuomintang e, no período de 1927-36, foi capaz de sistematicamente aniquilar a maioria das áreas com bases comunistas.
Nova Democracia ou Revolução Permanente?
Isso leva a um segundo aspecto da revolução chinesa, que é a pergunta: quem a história provou correto? Davidson cita a observação de Trotsky de que a tentativa de Stalin de ressuscitar a política de uma “ditadura democrática revolucionária do campesinato e do proletariado”, que Lenin havia explicitamente abandonado em abril de 1917 (veja o capítulo 1 desta série), era completamente inadequado para a China:
“A fórmula da ditadura democrática perdeu completamente a sua utilidade… A terceira revolução chinesa, apesar do grande atraso da China, ou mais corretamente, do seu grande atraso se comparada à Rússia, não terá um período ‘democrático’, nem mesmo o período de seis meses que a revolução de outubro teve (novembro de 1917 a julho de 1918); mas será compelida desde o início a realizar o mais decisivo ataque e destruição da propriedade burguesa na cidade e na aldeia.”
― A Terceira Internacional Depois de Lenin, 1928
Davidson afirma que a teoria de Mao da Nova Democracia se provou correta contra essa previsão de Trotsky. Vejamos os fatos: Primeiro, apesar das repetidas tentativas de Mao, ele nunca foi capaz de conseguir um governo de coalizão com Chiang. Segundo, quando os Comunistas estavam avançando pela China ao fim da guerra civil, o grosso da burguesia chinesa fugiu para Taiwan com Chiang, eliminando o crucial elemento burguês da “Nova Democracia”.
Mais importantes que isso foram as mudanças nas relações de propriedade que se seguiram ao estabelecimento da “República Popular da China”, em outubro de 1949. É importante notar que, até 10 de outubro de 1947, Mao nem sequer levantava o slogan de derrotar o regime do KMT. Foi a ocupação da região base de Yenan pelas tropas dos Kuomintang e a percepção de Mao de que nenhuma compromisso era possível e que o governo de coalizão de “tipo Nova Democracia” era uma sonho utópico, que finalmente forçaram o PC chinês a lutar pelo poder de Estado – em violação às ordens explícitas de Stalin. Ao mesmo tempo em que o Partido Comunista resolveu derrubar Chiang, ele tomou o rumo corolário lógico de anunciar um esquema de reforma agrária similar à “política para o camponês rico” que Mao tinha seguido nos anos 1930, só que muito mais radical do que a tímida redução de aluguéis da terra (e a sua coleta forçada pelo Exército Vermelho) no período 1942-47.
Além disso, seguido à proclamação da República Popular da China em outubro de 1949, o PC chinês montou um “regime de coalizão” no qual, apesar da presença de alguns poucos políticos pequeno-burgueses “democráticos”, o poder governamental estava claramente nas mãos dos Comunistas. Mais importante, o poder de Estado estava baseado no domínio militar inquestionável do Exército Vermelho. O grosso da burguesia havia fugido para Taiwan.
Com o suporte da ajuda soviética, os Comunistas iniciaram a construção de um setor de indústria pesada, enquanto fizeram um arranjo para a continuação da propriedade privada de alguns produtos sob controle e supervisão do Estado. Finalmente, essa política foi estendida com a entrada chinesa na Guerra da Coréia, que levou a uma série de medidas contra os capitalistas nacionais, começando no início de 1952.
Então, por gentileza, camarada Davidson, você pode nos informar onde está o prolongado período da etapa democrática? Toda essa evolução é a prova dramática do total utopismo fantástico ao qual levavam as teorias de Mao. Mais de uma vez o PC chinês declarou o seu desejo de estabelecer um regime democrático burguês, mas as relações de propriedade resultantes foram aquelas de um Estado proletário.
Podem camponeses estabelecer um Estado proletário?
Foi estimado que em 1949 os trabalhadores constituíam não mais do que 5 por cento dos membros do Partido Comunista Chinês; ele, portanto, era esmagadoramente um partido de camponeses e intelectuais pequeno-burgueses. Ainda assim, Trotsky defendia que só a classe trabalhadora, com uma liderança revolucionária, poderia estabelecer a ditadura do proletariado. Como explicamos a “terceira Revolução Chinesa”? Primeiro, devemos ter clareza de que esse não foi o padrão previsto por Trotsky. O marxismo demonstrou que, em polarizações de classe agudas, que ocorrem em todo período revolucionário, o campesinato irá se dividir entre os elementos seguindo a burguesia e aqueles seguindo o proletariado; que o campesinato sozinho não tem o poder social para derrubar a resistência dos exploradores capitalistas, nem os interesses de classe unidos necessários para estabelecer as formas de propriedade socialistas. Entretanto, a revolução chinesa de 1949 foi realizada por um partido e por um exército predominantemente camponeses, sob a liderança de uma burocracia militar pequeno-burguesa. Mas embora isso tenha sido diferente das expectativas dos trotskistas, não contradisse o programa marxista essencial de chamar a classe trabalhadora a estabelecer o seu próprio poder de classe, apoiada pelo campesinato, mesmo nos países atrasados, como o único meio de resolver as tarefas democráticas da revolução burguesa.
A razão fundamental para o sucesso dos Comunistas chineses baseados no campesinato foi a ausência de um proletariado lutando em seu próprio nome pelo poder. A classe trabalhadora chinesa estava desmoralizada e dizimada pelas contínuas derrotas sofridas durante a segunda revolução chinesa (1925-27). E a política posterior do PC foi desencorajar deliberadamente ações proletárias. O segundo ponto fundamental é que o resultado da vitória militar do PC chinês em 1949 não foi um Estado proletário saudável, como o criado pela Revolução Russa de 1917, mas um Estado proletário deformado, no qual o proletariado não possuía o poder político. Ao invés disso, o poder de Estado está e tem estado desde 1949 nas mãos de uma pequena casta burocrático-militar stalinista, composta pelas camadas superiores do PC chinês, pelo Exército de Liberação Popular e pela burocracia estatal. Como demonstrado pela repetida falha das políticas econômicas do regime chinês (notadamente o “Grande Salto Adiante”) e da incapacidade de criar formas democráticas de poder dos trabalhadores (mesmo no período da demagógica “Grande Revolução Cultural Proletária”), a única forma de abrir o caminho para o socialismo na China – a completa abolição das classes sociais, é através de uma revolução política para derrubar essa casta militar-burocrática.
(Em adição, no fim dos anos 1940, o regime de Chiang era tão terrivelmente corrupto que ele virtualmente tombou por si próprio. Mukden, Pequim e Cantão, todas se renderam sem disparar um tiro ao fim da guerra civil. Além do mais, a classe dominante dos EUA tinha ficado tão descrente do governo do KMT que ela essencialmente retirou o seu apoio material no período de 1948-49. Finalmente, o exército Comunista, que estava muito necessitado de armas, repentinamente foi equipado com uma grande quantidade de moderno armamento japonês depois da ocupação russa da Manchúria. É essencial que essas circunstâncias especiais sejam entendidas. Para colocar de outra forma, estivesse o proletariado chinês lutando com sua própria bandeira, a bandeira da Quarta Internacional, a vitória dos exércitos camponeses de Mao teria sido impossível).
Hoje, depois que a mistificação da “Revolução Cultural” se desgastou e a burocracia reassumiu controle direto do governo chinês, é muito mais fácil compreender que a China, assim como a URSS, os países da Europa Oriental, Cuba, Vietnã do Norte, é um Estado proletário deformado. Entretanto, apenas os trotskistas ortodoxos tem mantido essa posição desde os primeiros momentos do regime de Mao. A resolução de 1955 da convenção do SWP sobre a revolução chinesa declarou:
“Ao longo da revolução, Mao e Cia. continuaram a impor restrições arbitrárias e limites sobre o seu curso. A reforma agrária foi realizada ‘em etapas’ e se completou somente quando o ataque do imperialismo norte-americano estimulou a oposição dos latifundiários durante a guerra da Coréia… Os stalinistas chineses foram capazes de chegar ao poder porque a classe trabalhadora chinesa estava desmoralizada pelas contínuas derrotas que sofrera durante e após a segunda revolução chinesa, e pela política deliberada do PC chinês, que subordinava as cidades, e acima de tudo o proletariado, à luta militar no campo e assim bloqueava o levantamento dos trabalhadores como uma força política independente. Assim, o PC chinês aparecia aos olhos das massas como a única organização com quadros políticos e conhecimento, apoiada, além do mais, por uma força militar.”
― “A Terceira Revolução Chinesa e suas Consequências”, outubro de 1955
O que é necessário é um partido que tenha a coragem de dizer a verdade às massas, mesmo em tempos em que esta possa ser pouco popular, e que entendam a dinâmica da revolução permanente para poder defender esses ganhos do ataque imperialista e levar à frente a luta em direção ao socialismo. Os maoístas, com seus sonhos reacionários de “frentes únicas” com a “burguesia progressiva” e entusiasmo cego com a assim chamada “Revolução Cultural”, que não resolveu nada, se provaram incapazes dessa tarefa. Ela cabe aos partidários da Quarta Internacional, os verdadeiros herdeiros da tradição de Marx, Lenin e Trotsky.